*Imagem: Ray Caesar



AP 302


Era já noite, de um domingo nada corriqueiro. Pegar o táxi, pensar cuidadosamente os detalhes da noite, fumar o último cigarro (o tabaco geralmente destoa da sua imagem puritana). Desde que tinha começado o estágio no escritório esse era seu primeiro encontro com um cheque nominal adiantado. Óleos de massagem, combinação de renda preta, cinta-liga, hobby, chicote, algemas, tudo na maleta como ele mesmo pediu. Ah! Não esquecer de escovar bem os dentes antes das buzinadas escandalosas na frente do prédio, senão acaba tendo que chegar mascando chiclete enquanto cheira o pescoço do vice-presidente da empresa. Ela era estudante de direito e o táxi já chegara a sua porta. A noite convida, o rádio informa 22:30, enquanto toca Help!-Beatles, e a cidade parece apagar as luzes do quarto. Ela recebera o endereço por email, referências devidamente enumeradas, enviado provavelmente pela assessora pessoal, o mercado de trabalho tende a ser cada vez mais calculista. Pronto, é aqui: Rua Carijós 1884 Ap 302. Meu nome já havia sido informado na portaria, Suzanne Lins. Ainda tenho que aguentar responder a codinome de prostituta. É preciso galgar andares na vida.
Ele tinha que segurar a ansiedade pra não abrir a porta antes que ela aperte a campanhia. Sempre utilizara aquele mesmo endereço para encontros furtivos em noites de domingo. Já agradecera a sogra que tem, era a primeira coisa que fazia depois de deixar sua esposa pro pacato jantar em família. Hugo Boss nos cantos do corpo, depois do banho, claro. Umas doses de uisque pra não perder o costume. Saint Clair a 7°, safra de 2004. Havia uma sequência pré-determinada na sua cabeça, era metódico, só gozava assim. Tamanha praticidade provinha da especialização em finanças, a faculdade de direito só havia lhe dado o tom refinado.


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